
Parece inadmissível que um cineasta do porte de Francis Ford Coppola permaneça dez anos sem filmar. Afinal, o diretor da trilogia O PODEROSO CHEFÃO, A CONVERSAÇÃO, APOCALYPSE NOW e tantos outros filmes marcantes do cinema americano contemporâneo se afastou da direção durante a última década com o intuito declarado de se reinventar, de deixar de ser “um diretor profissional para ser um diretor amador”, nas palavras do próprio. Pois Coppola retorna à função no ano passado, com o independente YOUTH WITHOUT YOUTH, pondo fim a esta aposentadoria prematura e auto-imposta. O novo filme ainda aguarda estréia em telas brasileiras, mas o lançamento em DVD da edição especial de O HOMEM QUE FAZIA CHOVER (THE RAINMAKER, EUA, 1997, Paramount), o último filme de Coppola até então, ajuda a esclarecer as razões por trás desse afastamento do cineasta da cadeira de diretor.
O HOMEM QUE FAZIA CHOVER fala sobre a luta de um jovem e idealista advogado (Matt Damon) contra uma gigantesca companhia de seguros, que se recusou a cobrir os custos do tratamento de um doente terminal. Trata-se de uma adaptação do romance homônimo de John Grisham, autor celebrado por Hollywood nos anos 90, graças a sua fácil comunicação com o público estabelecida através de suas tramas jurídicas. Da obra do autor saíram filmes de sucesso como O DOSSIÊ PELICANO, O CLIENTE e TEMPO DE MATAR. Coppola foi fisgado ao ler O HOMEM QUE FAZIA CHOVER durante uma viagem de avião, principalmente graças aos personagens coloridos e exóticos. Realmente, são eles os grandes atrativos da adaptação, do advogado gângster vivido por Mickey Rourke, em um de seus muitos comebacks que anteciparam seu atual sucesso em Veneza com THE WRESTLER, à velhinha que dá abrigo ao protagonista, interpretada pela veterana Teresa Wright, de clássicos como OS MELHORES ANOS DE NOSSAS VIDAS, ROSA DE ESPERANÇA e DOMINADOS PELO TERROR. De resto, é um filme até convencional, dirigido e escrito com competência, mas sem brilho, como se o realizador estivesse realmente cansado das engrenagens da indústria.
De todos seus colegas de geração (Spielberg, Lucas, De Palma, Scorsese), Coppola foi o que mais radicalmente transitou entre filmes profundamente pessoais (O FUNDO DO CORAÇÃO, APOCALYPSE NOW, A CONVERSAÇÃO) e projetos de estúdio (PEGGY SUE - SEU PASSADO À ESPERA, JACK). O HOMEM QUE FAZIA CHOVER pertence claramente ao último grupo, mas sem a genialidade que o cineasta conseguiu inserir em outros filmes de encomenda, como o próprio O PODEROSO CHEFÃO e DRÁCULA DE BRAM STOKER. Talvez aí já se fizesse sentir a necessidade de se reinventar. Nos dez anos que passou ausente, Coppola investiu em sua vinícola e em lucrativas produções de horror como A LENDA DO CAVALEIRO SEM CABEÇA e a série OLHOS FAMINTOS. O objetivo sempre foi obter independência financeira para tocar seus próprios projetos, como o abandonado MEGALOPOLIS, para o qual chegou até a procurar locações no Brasil, e o já citado YOUTH WITHOUT YOUTH. Nos extras que acompanham a edição especial de O HOMEM QUE FAZIA CHOVER (todos legendados com exceção dos comentários em áudio), Coppola discorre sobre seu método de direção, como ensaiar exaustivamente antes do início das filmagens, permitindo com que os atores colaborem com improvisações que são posteriormente incorporadas ao roteiro. É provável que este método não tenha encontrado facilmente seu espaço dentro de uma indústria apressada como a hollywoodiana, ou que simplesmente Coppola tenha perdido interesse nas histórias geradas por esta indústria. Em todo caso, que esta ausência não se faça sentir novamente.
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