quarta-feira, 25 de novembro de 2009

007 - Quantum Of Solace

Enredo é apenas uma desculpa para o diretor Marc Forster construir seqüências longas, brutais e bem editadas de ação, atualizando de vez o charmoso espião inglês para o século XXI
Por: Rodrigo Carreiro
O 22º longa-metragem da mais antiga franquia cinematográfica do cinema radicaliza o principal objetivo de “Cassino Royale” (2006), o título anterior da série: atualizar a imagem do espião inglês para o século XXI. Ancorado no extraordinário sucesso comercial alcançado pelo antecessor, “007 – Quantum of Solace” (EUA/Reino Unido, 2008) chuta o pau da barraca de uma vez por todas. O velho agente secreto com licença para matar – aquele homem charmoso, conquistador incorrigível, que derrotava adversários sem manchar a grava borboleta ou desfazer o penteado impecável – pertence ao passado. O novo James Bond (Daniel Craig) passa longe da pedra de gelo emocional que era o personagem, em suas vinte primeiras encarnações. Ele está de coração ferido. E se um cara como Bond já é perigoso em seu estado normal, deve virar um trator incontrolável quando fica com raiva, certo?
Escrito pelo mesmo trio de autores responsável por “Cassino Royale” (Neal Purvis e Robert Wade rascunharam o roteiro, finalizado depois pelo vencedor do Oscar Paul Haggis), “Quantum of Solace” não foi baseado num romance de Ian Fleming, criador de 007. Para demarcar com firmeza a distância entre o James Bond do século XXI e o antigo personagem, egresso da Guerra Fria, eles também decidiram fazer, pela primeira vez, uma seqüência lógica da aventura anterior. Até então, os 21 títulos da série funcionavam como obras independentes, que podiam ser vistas em qualquer ordem. O longa de 2008, porém, retoma a história do título de 2006 do ponto onde ela havia parado. Devastado pela morte da amada Vesper (Eva Green), no fim do filme, James Bond (Daniel Craig) decide ir contra as ordens de M (Judi Dench) e seguir investigando a misteriosa corporação internacional que financia terroristas e ditadores.
O enredo de “Quantum of Solace” (o título original, mantido no Brasil, é uma expressão idiomática inglesa difícil de traduzir, mas que poderia ser algo como “um mínimo de consolo”) não tem, na verdade, muita importância. É um McGuffin, uma mera desculpa para que o versátil diretor suíço-alemão Marc Forster possa desenvolver longas, brutais e extremamente bem editadas seqüências de ação física. Na trama, James Bond segue os passos de um empresário (Mathieu Amalric) que gerencia uma organização não-governamental ambientalista de influência mundial. Trata-se de uma instituição de fachada para negócios criminosos multimilionários. Mas o próprio Bond não está muito interessado nisso. O que ele quer mesmo é detonar todas as pessoas responsáveis pela morte da mulher amada. Para isso, não apenas desobedece às ordens do serviço secreto britânico, como também não hesita em usar amigos (e depois abandoná-los) apenas para cumprir a tarefa auto-imposta. Um homem de alma torturada, emocionalmente no fim da linha.
Sabendo que o sucesso do filme está diretamente vinculado às seqüências de ação, Marc Forster não perde tempo, e o filme abre com uma espetacular perseguição de carro por estradas italianas, seguida por outra perseguição incansável – desta vez, pelos telhados e varandas de uma pequena vila na costa da Itália. Espectadores atentos irão notar a enorme semelhança desta cena com a extraordinária seqüência de “O Ultimato Bourne” no Marrocos. Mais uma vez, fica evidente que a trilogia do agente sem memória estabeleceu o padrão de excelência que todos os filmes de ação deste início de século XXI tentam seguir. Tanto é verdade que o diretor de segunda unidade dos três filmes Bourne, Dan Bradley, foi contratado para auxiliar Forster nas filmagens em locação.
O resultado, sem dúvida, é muito bom. Contando com um trabalho de montagem veloz e eficiente, “Quantum of Solace” possui seqüências de ação extremamente brutais, filmadas sempre com câmera na mão, mas sem jamais perder o senso de geografia e o clima de urgência. O espectador nunca se sente desorientado (como freqüentemente acontece com aventuras de qualidade inferior) e também nunca perde a sensação de estar dentro da ação, com o coração acelerado, saltando de um lado para outrro, tomando e desferindo pancadas. Para alcançar este resultado, a equipe criativa utiliza cortes velozes e abusa dos “chicotes” (movimentos laterais de câmera rápidos e improvisados, como se a pessoa que estivesse manuseando o equipamento estivesse correndo).
A variedade de seqüências de ação é enorme. Além das já citadas perseguições de carro e sobre telhados, outras cenas de ação envolvem barcos e aviões. Com tudo isso, o inglês Daniel Craig prova mais uma vez que o papel lhe cai muito bem. Ele tem o corpo perfeito para alguém capaz de realizar tantas proezas físicas, e capacidade dramática acima da média. Sua expressão rígida e os olhos duros ajudam na composição do personagem, embora seja relativamente difícil, para a platéia, se relacionar num plano emocional com um homem que passa por um momento sem humor, e exercita seu charme pessoal apenas para cumprir objetivos estritamente pessoais. O restante do elenco dá conta do recado sem problemas, incluindo a bela Olga Kurylenco, atriz sul-africana-ucraniana que assume o posto de Bond Girl sem passar pela cama do espião.
Se a falta de um enredo consistente impede “Quantum of Solace” de se tornar um dos
grandes filmes da franquia, não resta dúvida de que o filme cumpre com eficiência o papel a que se propõe. De quebra, ainda agrega pontos extras ao currículo de Marc Forster, um diretor capaz de transitar sem dificuldades por terrenos tão distintos quanto os thrillers sobrenaturais (“A Passagem”), os dramas infanto-juvenis (“Em Busca da Terra do Nunca”) ou sexualmente explícitos (“A Última Ceia”), e as comédias metalingüísticas (“Mais Estranho que a Ficção”). Ah, e a canção-tema do filme, composta por Jack White e executada em dueto com Alicia Keyes, emoldura muito bem os créditos de abertura, buscando raízes no funk pesado à Led Zeppelin. Não faria feio num disco como “Physical Graffiti”, um dos grandes clássico do Led nos anos 1970. Para amantes de música bem feita, é um atrativo extra interessante.
http://www.cinereporter.com.br/dvd/007-quantum-of-solace/

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