quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Napoleão Dynamite


Cópia xerox dos trabalhos de Wes Anderson, filme é comédia melancólica razoável
Por: Rodrigo Carreiro

Pequenas sutilezas separam os grandes artistas dos menores. A máxima serve para explicar porque o badalado hype criado em torno do filme independente “Napoleão Dynamite” (Napoleon Dynamite, EUA, 2004) não vai muito além disso: apenas um hype. Estréia na direção de Jared Hess, o longa-metragem foi aplaudidíssimo no Festival de Sundance, comprado pela distribuidora Fox Searchlights e lançado em escala global nos EUA. Seguiu-se uma enxurrada de críticas positivas e um movimento boca-a-boca entre cinéfilos, que levaram o filme a faturar US$ 43 milhões, cifra excelente para uma produção que custou só US$ 400 mil. Baixada a poeira, fica a pergunta: o filme é tão bom quanto dizem?
“Napoleão Dynamite” é uma pequena comédia melancólica, em tom nostálgico e leventemente onírico, irreal, uma crônica idealizada da vida adolescente numa pequena cidade rural nos Estados Unidos. É um filme engraçado, sim, embora essa graça não deva ser medida pela quantidade de gargalhadas, porque não há piadas. O filme se situa bem longe do tipo de comédia rasgada que Hollywood gosta de praticar quando retrata o cotidiano dos adolescentes em filmes bobalhões e estridentes. “Napoleão Dynamite” não é isso. Só que fica pequeno junto de filmes alternativos feitos para o mesmo público. Não tem a vibração de um “
Donnie Darko”, nem a critividade de “Três É Demais”, nem a veia satírica do velho clássico “Curtindo a Vida Adoidado”.
O longa-metragem retrata uma fatia da vida do Napoleon Dynamite do título (Jon Heder). O sujeito é meticulosamente apresentado como uma espécie de rei dos nerds. Cabelo ruivo encaracolado, camisetas com estampas dos anos 1970, óculos enormes de lentes grossas, Napoleon leva a vida mais modorrenta e monótona que se pode imaginar, na pequena cidade de Idaho. Joga speedyball, desenha figuras de animais nos cadernos e leva porrada dos grandalhões da escola. Só reclama com gírias em desuso (“Heck!”), como aquele vizinho esquisito que teima em dizer “tri-legal”. E faz tudo isso sozinho. Napoleon é tão nerd que nem os outros nerds se aproximam dele. Isso faz dele um solitário crônico.
Vindo de uma família desajustada, o rapaz não poderia ser outra coisa. A família Dynamite mora num casarão que parece ter saído de uma máquina do tempo. O irmão mais velho, Kip (Aaron Ruell), passa os dias participando de chats na Internet e se apaixonando por garotas que não sabe como parecem. O tio Rico (Jon Gries) é vendedor e só pensa em voltar ao passado para jogar uma certa partida que, acha, lhe daria a chance de virar profissional de futebol. E a avó não pára em casa, vivendo em excursões com a namorada (?) e deixando para Napoleon a missão ingrata de alimentar uma lhama de estimação. Sim, você leu direito: uma lhama. “Napoleão Dynamite” é meticulosamente construído com elementos insólitos, bizarros. Essa é a sua verdadeira piada.
A estréia de Jared Hess na direção é interessante, mas tem um problema evidente: a falta de originalidade. Hess é um “copycat”, um imitador perfeito, mas não possui uma visão de mundo particular. Ele se revela um admirador tão maníaco do diretor Wes Anderson que praticamente construiu o filme com pedaços aleatórios do universo do cineasta texano. “Napoleão Dynamite” toma emprestados elementos de duas pérolas dirigidas por Anderson (“Três É Demais” e “Os Excêntricos Tenenbaums”), reorganiza tudo e cria um híbrido que repete, nos mínimos detalhes, todos os cacoetes e manias desses filmes. O único momento verdadeiramente original é a abertura, com os créditos colocados em pratos de comida e cadernos escolares, de maneira inteligente e barata.
De “Três É Demais”, Jared Hess roubou o visual ensolarado e colorido, a locação principal (um colégio secundarista de uma cidade pequena), bem como o personagem principal, que é uma óbvia variação do estudante Max Fischer, interpretado por Jason Schwartzman. De “Os Excêntricos Tenenbaums”, ele pegou a galeria de coadjuvantes insólitos (lembram-se de Pagoda, o indiano de calças cor-de-rosa?), a trilha sonora com hits dos anos 1970 e 1980 e até mesmo o tipo de tomada característica de Wes Anderson, com os atores de frente para a câmera, parados, de olhos vazios, recitando o texto sem emoção aparente.
“Napoleão Dynamite”, com o perdão da expressão, é uma cópia xerox dos trabalhos de Anderson, mas não possui aquele algo mais, a assinatura particular que retira o texano da multidão de diretores razoáveis e o coloca no patamar de autor. Falta a Jared Hess, talvez, o carinho insuspeito pelos personagens que Wes Anderson sabe demonstrar tão bem. Enfim, falta a Hess aquele toque sutil que o transformaria de artista mediano em craque.

Se você for atrás do DVD lançado nos EUA (Região 1), vai encontrar um pequeno bônus após os créditos: uma seqüência de seis minutos que foi exibida durante um segundo lançamento do filme nos cinemas. Não é nada muito especial, mas impressiona o fato de que, como foi filmada após as exibições em Sundance, a cena custou US$ 200 mil, a metade do orçamento do filme inteiro. Um fato significativo, que mostra como o poder do hype aumenta o valor das coisas de uma maneira irracional. Talvez isso explique também a hipervalorização com que a crítica norte-americana recebeu o razoável trabalho de Jared Hess.
http://www.cinereporter.com.br/dvd/napoleao-dynamite/

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