segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Caro Sr. Horten

Odd Horten (Bård Owe) é um condutor de trem. Aos 67 anos, esse homem metódico está para se aposentar. Sua vida, no entanto, resume-se apenas ao trabalho. O que ele fará agora? "Caro Sr Horten", que estreia nessa sexta-feira exclusivamente no Cinesesc (SP), é a crônica do personagem e de seus dias vazios em busca de algo para matar o tempo.
Escrito e dirigido pelo norueguês Bent Hamer ("Factótum", "Histórias de Cozinha"), "Caro Sr Horten" é uma comédia - mas uma comédia daquelas que exploram a esquisitice de seus personagens e das situações, conseguindo arrancar risos discretos e não gargalhadas. Diferente das comédias de riso fácil, cada vez mais apelativas e de mau gosto, a graça, aqui, está aliada à inteligência.
Não há propriamente uma narrativa, mas esquetes envolvendo o personagem cujo nome não nega o seu significado na língua inglesa (Odd quer dizer esquisito). Isso não é uma novidade na carreira do cineasta, que tem dedicado seus filmes a examinar a vida de homens peculiares em empregos curiosos. "Histórias de Cozinha" é sobre um cientista social que pesquisa os hábitos domésticos de solteirões noruegueses na década de 1950. Em "Factótum", baseado na obra de Charles Bukowski, Matt Dillon é uma espécie de pau-pra-toda-obra que mal dura um dia em cada novo emprego.
Em "Caro Sr Horten", Hamer coloca no centro do palco um homem que precisa colocar sua vida em novos trilhos depois da aposentadoria. Extremamente metódico, até seu pequeno apartamento está sob a sombra da ferrovia e o barulho dos trens é a trilha sonora quase incessante. Sempre munido de seu cachimbo, Horten começa a experimentar coisas novas, como passear por Oslo com os olhos cobertos.
Depois de 40 anos de serviço prestados à rede ferroviária, sempre com dedicação e disciplina, Horten é homenageado com uma locomotiva em miniatura. Nessa cena, durante um jantar, ele faz uma composição visual métrica que lembra o visual de filmes do sueco Roy Andersson, como "Vocês, Os Vivos", com a ação acontecendo com uma perspectiva de profundidade na imagem.
A vida do protagonista começa finalmente a mudar quando, no seu último dia de trabalho, ele perde a hora. A partir de então, a ação transcorre como um sonho estranho, com os fatos acontecendo numa ordem fora de cronologia.
O ator Bård Owe, que trabalhou com Lars von Trier em "Europa" e na série televisiva "O Reino", parece um Buster Keaton norueguês com seu rosto pétreo - algo conhecido como deadpan - capaz de mostrar as emoções sendo cozidas em seu interior em fogo brando.
A vida de O'Horten - como o personagem é conhecido - parece sem graça e corre o risco de ficar ainda mais. No entanto, Hamer aborda o poder de transformação que cada um traz dentro si. É algo que em "Caro Sr Horten" acontece de forma sutil - o que pode ser ainda mais poderoso.

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